Meus versos falam de amor por necessidade.
Assim como um fumante ascende o cigarro, ou
o alcóolatra toma seu primeiro trago antes do café da manhã.
Eu tento compensar, preencher essa lacuna,
aldravar essa porta que foi aberta,
e que esqueceram de fechar!
Preencher esse espaço com os meus versos,
expondo-me ao ridículo, sendo presunçoso,
querendo arrancar do peito esse ranço viscoso,
que os poetas teimam em chamar de amor.
Êxtase
A luz do castiçal lentamente se apaga,
Nossas mãos ansiosas se encontram,
O odor que na taça o vinho exala,
Excita ainda mais os nossos corações.
A transparência do robe acetinado,
Acentua a nudez da virginal donzela...
Enchendo de volúpia o meu corpo,
Que, sôfrego, arqueja ao lado dela.
Agasalho-me, em seu colo angelical,
Absorvendo a divinal fragrância
Que emana dos sentimentos puros,
Que o amor do seu corpo exala.
Levitando entre o sonho e a realidade
Desse amor excelso que acasala,
Desfaleço em êxtase supremo,
Como um escravo débil de senzala.
Outono Triste
Nesse outono a poesia perdeu a elegância,
Sem o brilho e o lirismo de outras estações.
Não se fala de amores nem de paixões, e
eclodiu na alma espasmos de dor e ânsia.
O cenário atual é de profunda desolação!
E o nosso povo alegre perdeu a esperança,
Pois a dor da perda que ficou na lembrança
Deixou cicatrizes indeléveis no coração.
Nesse outono triste o poeta desolado chora.
Pois seus versos perderam a singular emoção,
Como as flores de um final de estação
Na chegada taciturna e rigorosa do inverno.
Não há, pois, motivo algum para celebração!
A alma desfigurada está imersa em tristeza,
Nossa gente vive agora tantas incertezas,
Que o sorriso desapareceu da face humana.
Ao Som dos Atabaques
Ao som hipnótico dos atabaques,
Os pés descalços, ágeis e belos;
O contorcer de corpos tão singelos,
Enchem de mistério o umbral da sala.
Corpos flutuam num ritual sagrado,
Iluminados pela luz mística das velas.
Deusas negras cujas silhuetas revelam
A beleza sensual de seus antepassados.
Ouço suas vozes no canto aos orixás,
E o odor do suor e do incenso no ar,
E a bela negra que traz tatuada,
Nos rijos seios o rosto de Iemanjá.
E seu longo vestido branco de rosas,
Que bailam como as ondas do mar.
Devaneios
Eu queria ser como o vento que sopra forte
E a montanha que desafia o tempo.
Eu queria ser como o sol cuja luz nunca apaga
E a sequoia gigante que reina por sobre a floresta.
Eu queria ser como a lua rainha soberana da noite
E o aconchego de uma criança no ventre de uma
mulher.
Eu queria ter asas e poder voar alto, acima dos meus
sonhos.
Eu queria ter esses poderes e poder zombar da mor
Eu queria que a humanidade tivesse melhor sorte,
E que os homens fossem eternas crianças.
Espelho da Alma
Levantei-me ainda muito cedo!
O sol timidamente despertava.
O cheiro forte da terra molhada,
E alguns saguis nos arvoredos.
Pus-me lentamente a caminhar,
Bebi nas águas cristalinas da fonte,
E acendi o meu cigarro de palha.
Uma cigarra cantou e centenas
de outras entoaram seu canto estridente.
Eu seguia, seguia sempre em frente
Nessa manhã que acordou sorrindo.
E numa poça d´água, por um instante,
Vi o rosto brejeiro de um menino.
*
VEJA e LEIA outros poetas do MARANHÃO em nosso Portal:
http://www.antoniomiranda.com.br/poesia_brasis/maranhao/maranhao.html
Página publicada em julho de 2023
|